por Jamil Chade,
correspondente | Estadão Conteúdo
Com meses de atraso e sob pressão,
a Organização Mundial da Saúde (OMS) soou o alerta sobre o zika vírus, apontou
para uma proliferação "explosiva" e pode declarar emergência
internacional no início da semana que vem. No total, 4 milhões de pessoas podem
ser contaminadas nas Américas ainda neste ano, de acordo com a Organização
Pan-Americana de Saúde (Opas).
O cálculo tem como base a previsão de que o Brasil chegue a 1,5 milhão de infectados até dezembro. A diretora da entidade, Margaret Chan, anunciou a convocação de uma reunião de especialistas para segunda-feira com a meta de definir uma estratégia e sinalização de mudança de posição de sua entidade. Caso seja declarado como emergência, o surto seria o quarto na história a ganhar tal status - após H1N1, pólio e Ebola. A reportagem apurou, em Brasília, que a situação preocupa o Itamaraty e já estaria havendo uma pressão do governo brasileiro para que, em caso de emissão de um alerta mundial, não seja incluída a recomendação para que as pessoas não visitem o Brasil durante os próximos meses (com carnaval e Olimpíada no Rio). Procurado oficialmente, o Ministério das Relações Exteriores não se pronunciou. Mas, em Genebra, a OMS também já se mobilizava para tentar blindar o Brasil de um impacto econômico internacional negativo, impedindo restrições de viagens ou de comércio. Depois de meses em silêncio, na quinta-feira, Margaret Chan adotou um tom forte sobre o surto. "Há uma proliferação explosiva. Estamos profundamente preocupados. O nível de alerta é extremamente alto, principalmente diante da possibilidade de uma ligação com microcefalia. A relação ainda não foi estabelecida (mais informações nesta página). Mas há uma forte suspeita e essa relação mudou o perfil de risco. Estamos falando de proporções alarmantes", disse. "O nível de preocupação é alto, assim como a incerteza. Precisamos rapidamente de respostas." Agora, os cientistas da OMS vão examinar a progressão do vírus e determinar o que deve ser feito. Além de declarar a emergência, eles podem exigir que governos de todo o mundo coloquem medidas para identificar o vírus e recomendações sobre viagens poderão ser feitas. Outra medida que será anunciada é sobre os setores de pesquisa que terão prioridade. À reportagem, Margaret explicou que um dos principais motivos da reunião é a proliferação de recomendações que governos começam a fazer sobre viajar ou não ao Brasil. A estratégia de evitar um isolamento do País foi revelada pela alta cúpula da agência da ONU com exclusividade à reportagem, depois de receber sinais concretos de que governos na Europa e América do Norte estariam preparando recomendações mais duras. "As respostas precisam ser proporcionais", disse, afastando qualquer possibilidade de uma recomendação para que turistas evitem o Brasil. "Como é que faríamos isso? Teríamos de adotar até restrições internas de viagens", disse. Para ela, uma das principais funções da reunião de segunda-feira é a de padronizar as recomendações, justamente para evitar "medidas excessivas e inapropriadas". "Diante de tanta incerteza, temos de ter cuidado com as recomendações", afirmou. Nos Estados Unidos, as mulheres grávidas ou que estiverem pensando em engravidar já são orientadas a adiar viagens ao Brasil. O diretor do Departamento de Surtos da OMS, Bruce Aylward, que coordenou o combate ao ebola, prefere não se pronunciar a respeito. "A decisão por enquanto é de cada país", disse Aylward. "Obviamente, todas precisam agir com cautela, da mesma forma que deveriam pensar na dengue", ressaltou. Para cientistas e ONGs, a OMS está repetindo com o Brasil os mesmos erros no combate ao ebola. No caso da doença na África, a entidade só reagiu em março de 2014, quatro meses depois da descoberta do surto. Para parar a doença, a comunidade internacional gastou US$ 1,8 bilhão. Para Lawrence Gostin, da Georgetown University, em Washington, a demora da OMS pode ainda trazer consequências. "Às vésperas dos Jogos Olímpicos no Rio, esse vírus certamente tem um potencial de pandemia", alertou. "A resposta tem sido fraca e tardia." Aylward rejeitou qualquer crítica. "A palavra certa para usarmos é preocupação. Dizer que estamos alarmados não seria correto", insistiu. Ele se recusou até mesmo a reconhecer os números da Organização Pan-americana de Saúde (Opas), que declarou que sua previsão era de que o vírus atingiria 4 milhões de pessoas até o fim do ano apenas nas Américas. "Nós não falamos isso. No ano que vem, o número do Brasil vai cair. Houve uma transmissão intensa em 2015 e a tendência agora é de cair por ter um número menor de pessoas vulneráveis ao vírus", contestou. Já na avaliação do diretor da Opas, Marcos Espinal, a proliferação "vai continuar, vai sair das Américas e vai para todos os lugares". "Estimamos até 4 milhões de casos até o fim do ano." Sylvan Aldighieri, outro especialista da Opas, explicou que o cálculo foi feito depois que 2 milhões de pessoas foram afetadas pela dengue em 2015 na região. "No caso do zika, sem imunidade para cerca de 500 milhões de pessoas, acreditamos que teremos entre 3 milhões e 4 milhões de afetados", disse. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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